Você se considera uma pessoa criativa? Se sim, então você faz parte de uma minoria populacional – ao menos no Brasil. De acordo com uma pesquisa divulgada no ano passado, realizada pela Transcriativa, somente 37% dos entrevistados se veem como pessoas que contam com a criatividade em seu portfólio de habilidades. Mas será que o problema está em não sermos mesmo pessoas criativas ou na forma como interpretamos o conceito?
A criatividade, muitas vezes, está atrelada ao genial, ao artístico, à capacidade de fazer algo que impressione. Contudo, em uma definição mais simples de algo que soa tão complexo, ela pode ser interpretada como a capacidade de ter ideias novas e úteis. Numa solução improvisada ou numa piada pensada em um momento de relaxamento ou distração, a criatividade se mostra presente.
Então, por que nos sentimos tão distantes da criatividade? Para entender um pouco melhor o porquê de tal crença e, principalmente, como ela pode nos impactar, batemos um papo com a educadora e palestrante Clara Cecchini (capa), Criadora do Clube da Escrita CC, do Centro Brasileiro de Design de Aprendizagem e cocriadora da Escola Sem Fim.
Referência quando o assunto é criatividade, Clara será uma das atrações de um dos maiores eventos de criatividade do mundo, o Rio2C – se você ainda não garantiu o seu ingresso, não perca mais tempo. Por lá, ela guiará a palestra “Sessão Criativa: Aprendizado Autodirigido para Humanos de 2025”. Confira a entrevista com a educadora.

Maior evento de criatividade da América Latina, Rio2C 2025 acontecerá de 27 de maio a 1º de junho.
RH Pra Você: Clara, qual é a metodologia de ensino que você adota em seu trabalho como educadora? Quando as pessoas te procuram, o que elas estão buscando?
Clara: Eu tenho duas frentes principais de atuação. Uma como palestrante e outra como professora. Sou professora convidada da Fundação Dom Cabral e dou palestras para executivos – incluindo RHs.
O meu trabalho é sempre de aproximar grandes questões que estão em debate e hoje e acalmar as pessoas sobre elas. Demonstrar caminhos para que a transição para o futuro seja construída. No meio da inovação, não há uma “receita de bolo”, mas da criação de uma musculatura para a pessoa fazer melhores escolhas.
Como palestrante, tenho sido chamada para falar muito de ética e inteligência artificial, lifelong learning, entre outros assuntos relacionados. Além disso, ressalto a importância do design de aprendizagem. Nisso, o meu foco, que é o Centro Brasileiro de Design de Aprendizagem, é justamente o de fortalecer a aprendizagem como habilidade nas empresas.
As pessoas que desenham a aprendizagem dentro das empresas, estão sendo exigidas num novo nível, num novo patamar, e elas estão buscando formação para isso. Então, eu tenho desenvolvido essas pessoas. Tanto a liderança quanto os multiplicadores internos de conhecimento, que são os facilitadores dentro das empresas.
Na minha metodologia há muito o uso de técnicas de narrativa e a diversidade de formatos. E tudo é baseado na ciência da aprendizagem, para gerar engajamento em diferentes perfis.
RH Pra Você: Clara, o quanto o apego ao “eu não sou uma pessoa criativa” pode se desenvolver em uma crença limitante que nos impacta na vida e no trabalho?
Clara: Quando nós falamos sobre a valorização da criatividade, é importante pensarmos a respeito de onde vem essa crença do “eu não sou criativo(a)”.
No processo educacional, quando somos crianças, somos incentivados a sermos criativos. Mas em algum momento, na maioria das escolas, há uma transição na perspectiva. Eu saio do “estou criando” para o “estou respondendo”. Eu tenho que acertar. A gente passa a ser “treinado” para dar as respostas que esperam que sejam dadas. E no mundo corporativo o cenário costuma ser o mesmo. Temos um problema que são as métricas que só são focadas na eficiência e na produtividade. Essas métricas servem para um universo no qual tudo é previsível. Só que quando tudo é previsível, as máquinas podem executar o serviço. E como nós vamos competir com elas?
O debate em torno disso é, muitas vezes, superficial, como se fosse uma escolha do indivíduo. Mas todos os nossos sistemas são construídos para validar um trabalho repetitivo.
RH Pra Você: E como mudamos isso?
Clara: O meu foco está na aprendizagem. E a criatividade é vista como uma habilidade. Ela pode ser desenvolvida – embora há quem não acredite nisso – e não deve ser somente ligada a algum tipo de expressão artística, por exemplo. Entender isso é importante.
A criatividade é a essência do que é humano. Eu me realizo quando eu crio. Uma boa estratégia de negócios precisa de muita criatividade. Sendo uma pessoa criativa, eu faço conexões entre áreas que não seriam feitas sem ela, que outras pessoas não fariam.
Quando a criatividade é pensada como habilidade, pode ser um incentivo para se entender que, de fato, ela pode ser desenvolvida. Há método. Vários, inclusive.
RH Pra Você: E isso traz um peso – positivo – a mais para a cultura do negócio. Mas é uma “virada de chave” simples?
Clara: Para se pensar em cultura organizacional e desenvolvimento de pessoas, o olhar deve ser direcionado ao soft e ao hard [das habilidades].
Nós aprendemos técnico, técnico, técnico, mas hoje o mercado começa a exigir mais um conjunto de habilidades emocionais. Noto, por exemplo, e pesquisas embasam essa percepção, que o desenvolvimento comportamental parte muito das empresas. Os profissionais, quando por conta própria, ainda focam muito no técnico.
O que eu faço no meu trabalho, inclusive no Centro Brasileiro de Design de Aprendizagem, é criar metodologias para profissionais de educação corporativa trabalharem as soft skills em contextos de desafios reais. As pessoas precisam entender a importância do equilíbrio. Um aprendizado efetivo não separa o técnico do comportamental.
Quanto mais a gente pensar numa educação integrada, melhor. Mas há um “pulo do gato”, que é poucas vezes deixarmos a aprendizagem “visível”. Não basta eu fazer um exercício com os participantes, se depois eu não realizo uma boa discussão deixando claro o que foi trabalhado ali. É o que chamamos de debriefing. Portanto, o pós é tão importante quanto um exercício bem desenhado. É você conectar os contextos trabalhados com o dia a dia das pessoas.