Até quando vamos fragmentar a visão da saúde das pessoas?
A visão fragmentada da saúde opõe-se à visão holística, que considera a saúde como um fenômeno multidimensional, envolvendo aspectos físicos, psicológicos, sociais e culturais.
Todos esses aspectos são interdependentes, não podem ser tratados separadamente. O corpo, a mente e o espírito participam de um todo dinâmico e interligado. Assim sendo, não podemos dissociar os fatores externos da organização da análise da qualidade de vida no trabalho. Somos a mesma pessoa durante as 24 horas do dia, com alegria, tristeza, felicidade, etc.
Fatores externos ao ambiente de trabalho, tais como: insegurança pública, a qual as pessoas estão expostas e são postas à prova, diariamente, em seus diversos deslocamentos; insegurança física, mental e emocional, face à desatenção pelos equipamentos sociais públicos existentes, mas nem sempre disponíveis, sem falar das carências pessoais de ordem financeira, alimentar, habitacional, não satisfeitas.
A visão holística da saúde considera as interações da pessoa com o mundo
Somos indivíduos. A palavra "indivíduo", do latim individuus, que significa " indivisível" ou "não dividido", por si só justificaria a impropriedade da visão parcial das pessoas no ambiente do trabalho.
Mas parece que estagnamos a visão holística e continuamos a ver as pessoas divididas: uma parte fica estacionada na porta da empresa e a outra parte entra para trabalhar.
Pessoas são seres indissociáveis e precisam ter atenção não apenas enquanto em atividade laboral, mas também à sua vida extra trabalho. Afinal, a vida é o todo: trabalho e extra trabalho.
Não podemos adotar as práticas de gestão já revisadas, do passado, que rotulavam a postura das pessoas com frases como esta: "Deixe seus problemas do lado de fora da empresa..."
Impossível, pois precisaríamos adotar uma identidade falsa e interpretá-la durante todo o tempo no trabalho, diariamente. Isso, com certeza, nos adoeceria. É isso que as empresas querem? Com certeza, não.
Atenção aos Riscos Sociais
Em 1980 lancei esta proposta, na época, inexistente, porque atuava em uma equipe de RH multidisciplinar, e tive que demonstrar a importância da inclusão do Social na análise de Riscos Ambientais. Esse trabalho valeu uma Moção do Ministério do Trabalho RJ.
Para a identificação e ação sobre os riscos sociais, partimos da determinação da frequência de “fatos sociais” e suas possíveis consequências, geradas por aspectos psicossociais.
O controle de risco normalmente dá ênfase aos aspectos não humanos, aos aspectos materiais, mas se considerarmos que todo recurso material, tecnológico, financeiro, inexiste sem a ação do elemento humano, reconheceremos a importância do aspecto social. Por quê? Porque o ser humano é um ser social. Já dizia Aristóteles.
Essa visão sistêmica do risco permite a valorização de todos os componentes dos fatos geradores de impactos aos resultados da organização.
A abordagem e ação sobre o risco social na organização são competências do Assistente Social, que tem a função de preservá-la de desvios nas áreas social e funcional, que possam gerar riscos.
Os fatores geradores de risco social podem ser agrupados em:
- Fatores motivacionais: aqueles relacionados ao crescimento profissional, responsabilidade, realização pessoal e profissional e que decorrem da qualidade da gestão nas empresas e
- Fatores higiênicos, vitais para a existência humana: alimentação, comunicação, educação, financeiro, habitação, integração social, assistência jurídica, lazer, saúde, segurança social, seguridade, transporte, enfim, o que não é responsabilidade direta das empresas, mas para os quais contribuem via benefícios, serviços e a remuneração.
Com relação ao risco ambiental, normalmente, é fácil a análise, pois ela está amparada por especificações editadas pelo sistema de segurança, tornando-a objetiva.
Já o risco social, por dizer respeito ao individuo, por vezes é pouco tangível, mas não impossível de controle, se for adotado e mantido um adequado sistema de identificação, monitoramento, desenvolvimento de ações, avaliação e realimentação.
E o que os Riscos Sociais tem a ver com a NR 01?
A Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), atualizada pela Portaria MTE nº 1.419, de 27 de agosto de 2024, incluiu a gestão de Riscos Psicossociais no ambiente de trabalho. Excelente!
Essa mudança exige que as empresas identifiquem, avaliem e controlem fatores que possam afetar a saúde mental dos trabalhadores, como estresse, assédio moral e sexual, sobrecarga de trabalho e insegurança no emprego.
E, a partir de 26 de maio de 2025, as organizações deverão integrar a avaliação dos Riscos Psicossocias no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), promovendo um ambiente laboral mais saudável e seguro.
As empresas devem implementar ações preventivas, oferecer suporte psicológico e promover um ambiente de trabalho saudável e equilibrado.
Aqui o pressuposto é a empresa como a fonte geradora dos Riscos Psicossociais, sem a menção do ambiente externo a empresa.
...não incluíram os Riscos Sociais, que cada uma das pessoas trabalhadoras traz consigo e dos quais não pode se apartar.
É aí que temos o espaço de ação reservada ao Assistente Social, que atua preventiva, corretiva ou promocionalmente como parte indispensável de uma equipe multidisciplinar, com ação transdisciplinar.
É por meio do Acolhimento Social, uma de suas ferramentas mais importantes nesse processo, que o Assistente Social obtém os indicadores sociais que impactam a saúde integral (física, mental, emocional, social e espiritual) das pessoas.
Acolhimento Social compreende três elementos em interação constante: a escuta, a troca de informações e o conhecimento da situação em que o cliente se encontra.
O Assistente Social não realiza esse trabalho sozinho, principalmente em situações críticas como a que enfrentamos atualmente. Por isso, é vital preparar e assessorar as lideranças para a ação nos três elementos citados: escuta, troca de informações e conhecimento da situação. Leia mais aqui.
Por Jorgete Lemos, Fundadora e CEO da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços; Membro do Conselho de Administração do CIEE - Centro de Integração Empresa Escola; Diretora Nacional de DEI AAPSA Associação Brasileira de Profissionais de RH - a partir de 2025. É uma das Colunistas do RH Pra Você. O conteúdo desta coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.