Mesmo com tanta tecnologia, canais disponíveis e investimentos em cultura organizacional, a comunicação ainda é um dos maiores desafios dentro das empresas.

Ruídos entre áreas, desalinhamento de expectativas, retrabalho e decisões tomadas com base em informações incompletas ou distorcidas são sintomas comuns de processos falhos — e muitas vezes invisíveis — de comunicação interna. O resultado? Equipes desmotivadas, líderes sobrecarregados e metas comprometidas.

Mas por que, afinal, é tão difícil se comunicar bem no ambiente corporativo? A resposta passa por fatores que vão desde a falta de clareza nos papéis de cada área até a ausência de uma estratégia de comunicação realmente integrada ao negócio. Como mudar isso? Quem nos conta é o palestrante, comunicador e âncora da CNN Phelipe Siani. Confira o papo:

RH Pra Você: Phelipe, hoje você tem essa missão de ajudar as empresas a melhorarem a sua comunicação, uma vez que se comunicar bem é um dos maiores desafios para as marcas atuais. Como é a sua troca com o público para que, de fato, gestores, líderes e RHs que te procuram possam ter uma visão diferente sobre a comunicação empresarial?

Siani: O primeiro ponto, que é um dos mais importantes, é que as empresas entendam, de verdade, que comunicação se faz olhando para dentro, não para fora. Via de regra, as organizações fazem comunicação olhando para o mercado, para os concorrentes. E isso é um problema. Esse é um processo que era feito há algumas décadas, quando não tínhamos tantos termômetros como hoje.

Atualmente, está muito menos complexo o comportamento da audiência. Seja pelo Analytics ou por dados das redes sociais, há muitos dados. Mas as empresas os ignoram. Eu sou muito guiado por dados. O YouTube, por exemplo, te guia por tendências, mostra o quanto um assunto tem sido ou não mais falado nos últimos tempos.

RH Pra Você: O que você tanto procura fora é o que já está sendo entregue dentro. E não percebe.

Siani: Você tem a ferramenta te mostrando se é interessante ou não falar sobre determinado assunto. Com isso em mãos, você começa a pensar na abordagem, que deve ser direcionada ao público que consome seu produto ou seu conteúdo. Mas, de novo, as empresas não fazem isso. São poucas que, de fato, fazem comunicação olhando para os próprios números.

Em resumo, fazer comunicação olhando para o concorrente a transforma numa commodity. E essa é a pior coisa que pode acontecer, porque você vai se comunicar do mesmo jeito que todo mundo se comunica. Você não vai conseguir mostrar os diferenciais competitivos da sua marca, do seu produto, do seu serviço. Com isso, as pessoas não vão entender o que você tem de diferente para mostrar ao mercado. Vale ser ousado, fazer o que ninguém está fazendo ainda.

RH Pra Você: As empresas têm as pessoas certas para que haja esse olhar?

Siani: As empresas precisam que a sua comunicação seja aprovada e feita por comunicadores, não por CEOs. Temos um problema chato que é a estratégia de comunicação, seja ela ou não publicitária, é feita ou barrada por CEOs ou diretores que não são da área. A comunicação é resolvida por comunicadores. Cargos técnicos devem barrar quando há erros técnicos.

Eu sempre brinco que um engenheiro, por exemplo, barra campanhas de comunicação por não gostar. Mas nenhum comunicador pede para um engenheiro refazer uma ponte que ele projetou. Cada expertise deve ser aplicada no lugar certo.

Portanto, os dados devem ser respeitados, devemos contar com as pessoas certas e temos, também, que olhar para nós mesmos, para a nossa impressão digital - ou seja, sendo autênticos.

RH Pra Você: Você falou sobre ter os profissionais certos para cada demanda e, nisso, há um aspecto que afeta a comunicação nas empresas que está na dificuldade nas trocas entre diferentes setores. Corrigir esse gap é algo que você acolhe nos processos de apoio aos gestores?

Siani: Nestes mais de 20 anos de carreira, o que eu fiz antes de começar a ir para a rua com as palestras? Olhei para dentro. Comecei a tentar entender tudo o que eu fiz ao longo do tempo que trouxe resultados e sistematizei. Trouxe a isso meu método, que está virando um livro, e que uso nas palestras, chamado ‘comeduxão’. O conceito inicial é muito simples, no qual a base é a comunicação de alta performance estar apoiada entre conexão e educação. Sempre. A comunicação desaba sem ambas.

Quando falo de conexão e educação, falo sobre o básico de ser compreendido. A educação, por exemplo, é o RH ter a missão de criar um comunicado para a empresa. Ele vai educar as pessoas ali dentro. Já a parte de conexão traz diversos elementos, podendo o comunicado ser engraçado, emotivo, com um pouco de drama, talvez. Vai da cultura da empresa. São técnicas usadas para comunicar internamente e externamente. A maior briga, hoje, é por atenção. Não adianta querer educar mandando e-mails chatos ou colando comunicados na parede.

Skills obrigatórias do RH

RH Pra Você: E isso não pode nunca ficar desconectado da alta gestão, correto?

Siani: Tudo isso tem a ver não só com comunicação, mas também com cultura. Ao engessar, perdemos a chance de engajar as pessoas. A cultura é top-down. Se o C-Level não respeitar a comunicação, sempre haverá um problema muito grande nas corporações. Se o CEO for uma pessoa que se tranca numa sala e não conversa com a equipe, é difícil ter uma comunicação interna eficiente, porque as pessoas entendem que o maior líder da empresa não é acessível. Então, acessibilidade não é algo dentro daquele negócio.

Nos treinamentos eu sempre falo que não se deve cobrar comunicação se você não se comunica. E isso deve ser feito de forma verdadeira. Não adianta o CEO ir a um evento, falar em um microfone e não permitir que ninguém possa se comunicar com ele depois. E além de tudo isso, deve existir empatia. Em nada ajuda o ‘tecniquês’, o que é excludente a muitos setores do negócio. Faça o exercício de enxergar pensando em quem não tem o seu conhecimento, quem não é do seu mercado. Fazer o simples não é fácil. Por isso, pouca gente faz.